6ª Temporada - Os RosaCruz (10)
Comandante Guélas
10
Fernindó, o poeta coxo de Paço de Arcos, foi encontrado sem vida debaixo de uma chata na Praia Velha, em 20 de julho de 1955, com um rolo de papel higiénico cheio de poemas. O seu congénere arménio Calouste também deu o berro neste dia, mas numa suite diferente, no número 52 do Hotel Aviz. No interior do “Aries” a luz do candeeiro da iluminação pública mantinha-se intacta, por isso fez resplandecer a cor dos tomates do Focas, agachado a fazer um soberbo cagalhão.
- Cagar é aquele espaço dos meus dias onde gosto de viver!
Pierre Pomme-de-Terre, filho do Barão Petroni, título saído num sabonete da Couraça, já tivera vários nomes, uma tradição do ramo profissional, o “descaminhamento”, evitando assim pecar, chamando em vão ladrão a alguém que tivesse de sair do país à pressa. Em face disto o grande artista do alheio paçoarcoense, o Vale e Azevedo de Paço de Arcos, como orgulhosamente o chamava metade da vila que não caiu no seu conto do vigário, tinha inúmeros perfis com licenciaturas várias em engenharia, como todos sabiam, principalmente o Focas, o primeiro a ser informado, pelo próprio, uma prenda de anos, do doutoramento do Pierre Pomme-de-Terre. Na nova página do Face Book dizia-se ser aborígene, do clã mandjalpingu (djimba), pertencente ao yolngu, com casa no Território Norte, onde vendia terrenos na Lua, mais propriamente na Cratera Von Kármán na bacia de Aitken, no Pólo sul, o lado oculto, através de escrituras pré-pagas on-line. Andava sempre com uma camisa verde com quatro bolsos.
- Meus queridos amigos, cada um destes bolsos representa uma virtude, - e apontou. – Honestidade, Justiça, Probidade e Humildade. É por isso que me vou candidatar à presidência da Liga Portuguesa Contra o Cancro, deixando estas latinhas, que fui buscar à casa da mãe do Peidão, neste estabelecimento, prometendo entrega-las cheias de ar, perdão, cheias com as vossas moedas. Bom Natal!
Enquanto isso o Dr. Cinzento, o único médico que punha mamas a todos os sinistrados que lhe caíssem nas mãos, lia o relatório médico da OCDE que informava que Portugal, o país vizinho, tinha uma prevalência de perturbações mentais de cerca de 23%, quase uma em cada quatro pessoas, sendo um dos recordistas no consumo de psicofármacos e antidepressivos.
- Do que nós nos escapámos, ainda bem que o Comandante Guélas declarou a independência daqueles malucos, - desabafou para o General Tubarão que estava sentado ao seu lado.
- Os teus pais são médicos, se mmmmmm. mmmmm... me trouxeres todos os remédios qq qqqq qqque que que o nome aca.. aca.. acabarem em" x", eu compro!
A vila-Estado de Paço de Arcos era uma ilha de liberdade, estabilidade e poder económico, que dizia a Portugal o que devia fazer, como no passado tinham feito os castelhanos. Desde o dia 28 de maio de 1974 começara a mamar nos peitos do vizinho socialista, tendo conseguido excitar todos os dotados. Em 1865 Algés já não comportava mais população, tinha 77 almas penadas, por isso o avô do Chato Louco decidiu, e bem, ir viver para Paço de Arcos. Graças a este visionário a vila-Estado ganhou um dos mais famosos “Cagacruzes”, ordem secreta isotérica cujo símbolo era um cagalhão em cima de uma carteira de fotos de passe da Jomarte. Nos finais do século XIX a Praia Velha era frequentada pela alta sociedade paçoarcoense, e foi lá que apareceu, um século depois, a uma resma de adolescentes, tal como em Fátima com os pastorinhos, por geração espontânea, debaixo de uma chata de um familiar do Velha, o maior cidadão de todos os tempos, Daniel José Martins de Almeida. No tempo do veraneio o Dr. Cinzento, uma sumidade na saúde do povo, preconizava banho de mar para fortalecer a raça paçoarcoense, águas estas que foram mais tarde reforçadas e aquecidas com a construção do Chalé da Merda. Os Rosas e os Cruz, habitantes ilustres da Praceta, onde vivia a intelectualidade da vila-Estado de Paço de Arcos, o Grilo, o Taka Takata, o Velhinho, o Marreco, o Velha, o Pilas, o Pica, o Tio Kiki, uniram-se e formaram a seita mais famosa da Costa do Estoril, os “RosaCruz”, com santuário na Jomarte. Por isso o Bigornas pendurou na porta um letreiro para afastar os indesejáveis clientes: procul hinc, procul ite profans (fora daqui, fora daqui profanos). Quando a Tita dos Pés Sujos, uma mulher de trajetos curtos, que ia do aquário das santolas à panela da cozinha, conheceu o seu Bajoulo, alargou os horizontes, passou a cruzar bares, tascas, acumulando um significativo pecúlio de vivências que soube converter em amor.